nº 78: A possível manipulação da crise econômica em prol dos interesses golpistas de Bolsonaro

Caros amigos/leitores,

Com a proximidade das eleições, estimo que a diversidade de assuntos que mereçam ser abordados nos Desmontes vá aumentar, E tais coletâneas já são algo extensas … Inicio, com este documento, nova forma de apresentação que pode repetir-se, função da receptividade de meus pacientes leitores. Serão escolhidos um ou dois assuntos julgados de maior relevância, que passarão a integrar virtuais desmontes temáticos. Neste documento será bordado apenas um, que denominei “A possível manipulação da crise econômica em prol dos interesses golpistas de Bolsonaro!”.

Certamente, a maior motivação para os desvarios golpistas de Bolsonaro se refere ao medo do peso da justiça que sobre ele (e sobre sua pouco nobre estirpe) recairá no momento em que se afastar da presidência e não mais contar com a proteção quase maternal de Aras e de Lira.  É, portanto,  questão vital não perder a eleição!  Bolsonaro tem a seu desfavor (entre outros tantos fatores …)  a inexistência de um programa de governo que tivesse dado rumo à economia do País e à sua gestão. De fato, a agenda neoliberal que abraçou  – já considerada ultrapassada alhures –   na base da diminuição do Estado, no  arrocho aos direitos trabalhistas e na  venda de ativos (até estratégicos) em privatizações concretizadas muitas vezes na bacia das almas, revelou-se um desastre. Não  existem realizações nem obras a exaltar. Assim, também inexistem argumentos para contrabalançar, junto à população, a crise econômica cada vez mais grave  que assola  a todos, mas afeta principalmente  os mais necessitados,  Ao contrário, aumenta a percepção da população sobre os males da inflação, do aumento de custo dos gêneros de primeira necessidade e da gasolina e  gás, para ficarmos somente por ai. O desemprego praticamente não diminuiu ao longo de seu governo e caiu a renda do trabalhador.  É certo que a pandemia e a atual guerra  Rússia versus  Ucrânia afetaram  o desempenho econômico. Mas tais percalços estão longe de  absolver o governo,

A respeito da atual situação econômica, tomo emprestado alguns dados constantes na Carta Capital (Anexo, item 4), comparando a situação em DEZ 18 com a de FEV 22 (fontes – IBGE, Dieese e Ag. Nac do Petróleo):  – Renda mínima dos trabalhadores, em reais – 2.705  x  2.511 : Desemprego (milhões de pessoas) – 14,9 x 14,7; Inflação (em %) – 3,7 x 10 (a inflação  bateu recorde em abril e já ultrapassa 12% em um ano); Custo da cesta básica (em reais e na cidade de São Paulo – 471,44 (53% do salário mínimo – SM)  x 761,19 (67% do SM); e Preço médio do litro de gasolina, em reais –  4,3  x 7,2.

Com base em informações advindas da Pesquisa Genial / Quaest (abril 22), verifica-se que, em porcentagens da população,  46 % acham que o principal problema do País é a economia; 98 % sentiram  o aumento dos preços, nos últimos meses; 74% acham que os preços vão continuar aumentando; e  59% sentiram que piorou a condição de pagar as contas nos últimos três meses.

Cabe destacar, a respeito,  que 19 milhões de brasileiros vivem com fome, do que resultam irreversíveis consequências na saúde e que  116 milhões de pessoas vivem em situação de insegurança alimentar no Brasil, com nefastos prejuízos,  principalmente para crianças (Anexo,  itens 1 e 2). O Brasil, que saíra do vergonhoso Mapa da Fome elaborado pela FAO em 2014,  voltou a nele constar em 2020!

Por tudo, forma-se a opinião de que várias das patetices bombásticas de Bolsonaro, além de buscar manter aceso o belicismo de seus adeptos, visam, também, desviar a atenção da população  sobre  a gravidade da situação econômica  que atravessamos e que tende a agravar-se ainda mais, haja vista, entre outros fatores, o  aumento que acaba de ocorrer  no preço do diesel (Anexo, Item 5).  (Em relação à Petrobras, as reclamações do presidente sobre a política de preços adotada pela  Empresa – como se ele fosse um cidadão comum –,  buscando retirar de si a responsabilidade maior pela situação que lhe cabe. é decididamente patética e de monumental hipocrisia! E o “gado” acredita!

Ora, tudo está a indicar que não há “mito” que resista a tais dados, acrescendo que as parcelas mais desprovidas da sociedade são mais imunes a influências ideológicas. Como poderiam? Seu problema básico – para muitos – é ter comida na mesa para si e família!

Infelizmente para o País, os fatos indicados fazem supor que a tentativa de golpe como saída de  Bolsonaro ante a derrota que se antevê é possibilidade  (alta probabilidade) que faz muito sentido, mesmo porque não há forma de reverter a situação econômica no tempo de governo que lhe resta, por mais que espalhe benesses financeiras  em desesperados esforços finais. Muito se tem abordado  sobre a “falta de confiabilidade” das urnas eletrônicas como motivo a ser alegado para a quebra da normalidade democrática. Ora, para que o argumento venha a ter alguma credibilidade, será necessário o exercício do voto nas eleições e a derrota de Bolsonaro que se delineia cada vez com maior clareza. (Certamente, no caso de uma vitória muito improvável de Bolsonaro, imediatamente as urnas passariam a merecer toda confiança …). Mas não está  merecendo maior e justificado destaque a possibilidade da tentativa de golpe apoiar-se em causas econômicas; de Bolsonaro buscar exatamente manipular a gravidade da situação  da economia para fins  de atingimento de seus intuitos. Paradoxo? Sim, mas que faz sentido. Vejo, a respeito, não apenas uma, mas duas possibilidades:

– uma onda insuflada de invasão a supermercados, com saques e agitação subsequente (milicianos e redes sociais); e

– nova greve geral de caminhoneiros (ver, a respeito, o Anexo item 7), à semelhança da ocorrida em maio de 2018 que foi comprovadamente insuflada pelo mesmo Bolsonaro. Com bloqueio de estradas, ameaças ao abastecimento e possíveis agitações decorrentes. (Para tal, seria bem explorada a versão de que Bolsonaro nada tem a ver com os aumentos de diesel e demais combustíveis, tudo culpa exclusiva da Petrobras …).

Em qualquer dos casos, seria factível ao governo invocar a necessidade de uma GLO  (operação de garantia da lei e da ordem) colocando a tropa na rua. Mas quando ela sairia de lá? Dependendo do timing, as eleições poderiam ser diretamente afetadas, em primeiro momento, sendo ainda possível uma evolução para o atentado ao Estado de Direito. Como sabido, outra possibilidade, constitucional (Art. 136), seria a decretação do Estado de Defesa, que depende apenas do presidente, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. (Para a decretação do Estado de Sítio – Art. 137,  é necessária a autorização prévia do Congresso).

  Parece que tais alternativas são mais favoráveis a Bolsonaro caso ele, por alguma circunstância, decidir tentar sua última cartada antes das eleições.

A respeito, um comentário final, algo chocante: como nos acostumamos com as desgraças dos outros! Dá para imaginar que entre os compatriotas nossos, cerca de um décimo passa fome em país que é o “celeiro do mundo”, o maior exportador mundial de carne bovina e o quarto maior produtor de grãos!?  É ainda em tal País que quase 60% da população sofrem de insuficiência alimentar!    

Agradeço colaboração recebida e os comentários favoráveis aos Desmontes recebidos de amigos mais condescendentes…

Aceitem o cordial abraço, como sempre, do

Luiz Philippe da Costa Fernandes

ARTIGOS SELECIONADOS PARA O DESMONTE Nº 78

ANEXO:

     1 –Brasil 2020: de volta ao mapa da fome” Elmar Bones    Logo Jornal JA    06ABR 21.
O Brasil voltou para o mapa da fome. Nunca saiu, na verdade. Em 2013, quando o país  saiu do Mapa da Fome da ONU, o IBGE ainda contava mais de 9 milhões de brasileiros passando fome. Agora voltou com tudo. Uma pesquisa divulgada nesta segunda feira, 05, conclui que no Brasil da pandemia 19 milhões de pessoas não sabem o que vão comer no dia seguinte. Isto é, em cinco anos cerca de 10 milhões de brasileiros entraram para o bloco da fome. Mais grave: os brasileiros em “situação de insegurança alimentar” chegam a 116,8 milhões. Ou seja, mais da metade da população não tem emprego ou renda para atender suas necessidades básicas, a começar pela comida. Os dados são do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, desenvolvido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN), como parte do projeto VigiSAN.”

Observar  que o artigo é de 2021. Passado um ano, certamente os dados atuais devem ser ainda mais graves.

2 – “19 milhões de brasileiros vivem com fome; consequências na saúde são irreversíveis” Camila Neumam  CNN 28 OUT 21.
Sobre o levantamento da  Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar já mencionada no item anterior: “Há muitas consequências decorrentes da insegurança alimentar e da fome. Segundo especialistas consultados pela CNN Brasil, elas envolvem problemas de saúde que se transformam em mazelas sociais, econômicas e educacionais e podem ser irreversíveis, sobretudo nas crianças. … “

3 ‘Estamos enfrentando mais da metade da população com algum tipo de insegurança alimentar’, diz técnica do Dieese”  – Gisele Aglieri  – 247 –  31 MAR.
“ A alta do preço dos alimentos é assunto que está presente todos os dias na mesa dos brasileiros, ao passo que cada vez se tem menos produtos nela. O programa Espaço Plural – Debates e Entrevistas convidou [vários especialistas, incluindo]  Daniela Sandi, economista técnica do Dieese, responsável por pesquisas, análises e estudos socioeconômicos… .  no Brasil a situação se agrava por ir na contramão dos outros países, até mesmo dos desenvolvidos: governo deixou ao sabor do mercado e isso compromete o poder de compra … esta é uma política ultrapassada, pondera a técnica do Dieese ao citar o abandono por parte do governo de políticas econômicas importantes, como a manutenção de estoques reguladores e  valorização do salário mínimo. … foi lembrado que o atual governo liberou o uso de muitos agrotóxicos, a maioria deles proibidos nos seus países de origem, dando ênfase à falta de outras políticas que fossem menos danosas à saúde, como circuitos curtos de produção e abastecimento para chegar alimentos de qualidade na mesa do consumidor. ‘O problema não é produção agrícola – somos um dos maiores produtores do planeta e ao mesmo tempo estamos enfrentando mais da metade da população em alguma situação de insegurança alimentar’, revela Daniela.”

4 – “Sem pão, com circo” – André Barrocal – Carta Capital  – 04 MAI,
“Diante das duras condições de vida, os festejos do Dia do Trabalho serão um marco contra o governo. Bolsonaro tenta, porém, desviar o foco dos problemas reais.”

5 – “Novo reajuste equipara preço do diesel ao da gasolina e já causa efeito cascata” Plinio Teodoro   Forum   10 MAI.
Tarifa do transporte público deve ter alta de 15,4% e preço do frete será repassado a consumidores. Associação de importadores pressiona por alta de 11% na gasolina, o que daria um acréscimo de R$ 0,93 por litro. O novo aumento de 19% no preço do diesel, que chega às bombas nesta terça-feira (10), já equipara o preço do combustível usado em grande parte por caminhões de transporte no setor de logística ao da gasolina em algumas regiões do país.”

6 – “Sob Bolsonaro e Guedes, inflação bate recorde em abril e já ultrapassa 12% em um ano”  theworldnews 11 MAI.
Brasil registrou a maior variação do IPCA para um mês de abril desde 1996, há 26 anos. Acumulado em 12 meses é o maior desde outubro de 2003”

7 –Reajustes de preços se tornaram insustentáveis’, diz líder de caminhoneiros” 24715 MAI.
 “O presidente da Frente Parlamentar Mista dos Caminhoneiros Autônomos e Celetistas, deputado federal Nereu Crispim (PSD-RS), criticou neste domingo (14) responsabilizou Jair Bolsonaro (PL) por causa da alta dos combustíveis. Conforme Crispim, os reajustes de preços pela Petrobrás se tornaram ‘insustentáveis’, e a categoria pode promover paralisações nas próximas semanas.”     

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